sábado, 17 de março de 2012

O Cinismo da Reciclagem


Considerações sobre o artigo: “O cinismo da reciclagem:*o significado ideológico da reciclagem da lata de alumínio e suas implicações para a educação ambiental” e sugestão de leitura complementar.

       O artigo referido acima precisa ser lido com cuidado e atenção para retirar dele toda a riqueza e qualidade crítica que oferece. Em um texto associado à abordagem dialética, o uso parcial de trechos ou afirmações fora do seu contexto pode levar a conclusões extremamente equivocadas. Assim, muitas vezes, leituras apressadas e, em outros casos, interesses não explicitados deturpam o sentido geral do artigo ao destacar apenas alguns aspectos e ignorar outros do artigo. Vejamos alguns exemplos:

- ao se tomar apenas as primeiras 4 palavras do título do artigo cria-se uma “expectativa” que o artigo discute a Reciclagem como um todo e que esta pode ser qualificada como “cínica” e ignora-se que o título completo já delimita e qualifica o tipo de abordagem propostas, ou seja, o que o autor se propõe é tratar sobre as implicações para a educação ambiental de uma dada ideologia (consumismo) associada à reciclagem de determinado produto/resíduo (latas de alumínio) . 

- algumas vezes o entendimento dado ao artigo ignora o alerta feito pelo autor logo no segundo parágrafo sobre a “complexidade do tema” e utiliza-se o artigo para desqualificar a coleta seletiva e deixa-se de fazer o que o autor espera da EA: “uma reflexão crítica e abrangente a respeito dos valores culturais da sociedade de consumo, do consumismo, do industrialismo, do modo de produção capitalista e dos aspectos políticos e econômicos da questão do lixo”

- por vezes ignora-se que o que o autor critica é o fato de se tomar  “a reciclagem do lixo uma atividade-fim, ao invés de considerá-la um tema-gerador para o questionamento das causas e consequências da questão do lixo, remete-nos de forma alienada à discussão dos aspectos técnicos da reciclagem”.

            Por fim deve-se considerar o contexto em que o artigo foi escrito: início dos anos 2000, quando empresas como a Coca-Cola investiam pesadamente em campanhas junto às escolas alimentando uma EA comportamentalista em detrimento de posições socioambientais mais críticas e participativas. 

            Por outro lado, mesmo continuando valendo todas as críticas apresentadas pelo autor do artigo acima citado atualmente vivemos um contexto um pouco diferente:  além de uma presença muito maior de abordagens crítico emancipatórias de EA nas escolas, a Educação Ambiental relacionada à coleta seletiva assume um novo patamar de tratamento com a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Um excelente exemplo sobre tal tratamento pode ser encontrado no “Caderno metodológico para ações de educação ambiental e mobilização social em saneamento” preparado por educadores para o Ministério das Cidades. 

O Caderno se insere no Programa de Educação Ambiental e Mobilização Social em Saneamento (PEAMPS)  e como diz em sua página 19: “Parte do pressuposto de que cada ator social pode colaborar com o seu conhecimento e trabalho, assumindo responsabilidades em prol da melhoria da qualidade de vida de sua comunidade e pela universalização dos serviços de saneamento, no contexto de respeito ao meio ambiente e aos interesses coletivos. Neste sentido, o caderno incentiva a reflexão crítica e atenta sobre as questões relacionadas ao saneamento, bem como procura instrumentalizar os grupos envolvidos na busca por ações qualificadas”.

            Assim convido a todos os interessados a fazerem leituras atentas e críticas desses dois importantes textos para a educação ambiental em sua relação com a questão do saneamento e em especial com os resíduos sólidos.  


Antonio Vitor Rosa – Educador Ambiental / LAIFE / FFCLRP / USP

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O Cinismo da Reciclagem

Caderno metodológico para ações de educação ambiental e mobilização social em saneamento
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